terça-feira, 24 de janeiro de 2012

R$ 2,4 milhões do Ministério do Esporte desaparecem de conta de ONG ligada ao PC do B


A Polícia Federal está investigando o sumiço de R$ 2,4 milhões de verbas do programa Pintando a Cidadania, do Ministério do Esporte, repassados à ONG "Instituto Cidade", de Juiz de Fora (MG), para a produção de materiais esportivos, como bolas, camisas e redes de vôlei. A ONG mineira terceirizou os serviços contratando uma cooperativa local para produzir os materiais.

O QUE DEVERIA TER SIDO FEITO E O QUE FOI PRODUZIDO PELO INSTITUTO CIDADE

ProdutoO que foi produzidoO que deveria ter sido feito
BolasNada8.000 unidades
Redes de futsal e vôlei400 unidades2.000 unidades
Camisetas26 mil unidades60.500 unidades
Bonés4.900 unidades61.250 unidades
  • Fonte: Ministério do Esporte

Mais de um ano após o início do contrato, em 3 de dezembro de 2010, porém, a ONG, que recebeu 100% da verba (R$ 2,409.522,44 milhões), produziu apenas 10% do material, e encerrou a produção depois disso. O próprio Ministério do Esporte, de acordo com documentos internos a que o UOL teve acesso – já encaminhados à Polícia Federal –, reconhece os indícios de desvio de recursos públicos e favorecimento a pessoas ligadas ao PC do B (Partido Comunista do Brasil) no uso das verbas cedidas à ONG. O partido comanda o Ministério do Esporte desde 2003.

Atualmente, as atividades do Instituto Cidade estão paralisadas. A reportagem esteve em Juiz de Fora e encontrou uma fábrica de material esportiva vazia. Um funcionário informou que tinha dispensado os mais de 40 trabalhadores, já que não havia dinheiro para produzir qualquer material ou efetuar pagamentos.

No dia 10 de novembro de 2011, cumprindo mandado da Justiça, a Polícia Federal apreendeu computadores e documentos na sede da ONG e em mais três endereços em Juiz de Fora, entre eles na casa do presidente da entidade, José Augusto da Silva.

Segundo o delegado federal Ronaldo Guilherme Campos, à frente das investigações, o que é possível afirmar até agora "é a existência de forte indício de que algo de irregular aconteceu". Ele precisará de "mais quatro ou cinco meses" para concluir as investigações, e diz que aguarda a quebra do sigilo bancário dos envolvidos.

O principal deles é José Augusto da Silva, presidente do Instituto Cidade e ex-cabo eleitoral de Wadson Ribeiro (PC do B), que está na suplência do partido para a Câmara dos Deputados. Wadson, ex-presidente da UNE (1999-2001), ocupou a Secretaria Nacional de Esporte Educacional da pasta até o final de 2011. O programa Pintando a Cidadania está vinculado a essa secretaria. Em novembro, Wadson deixou o Ministério, pouco depois da saída do então ministro Orlando Silva, no bojo de pesadas denúncias de corrupção na pasta.

Orlando e Wadson, com Ricardo Cappelli – que preside a comissão técnica da Lei de Incentivo ao Esporte – formavam o triunvirato de ex-presidentes da União Nacional dos Estudantes com cargos de destaques no Ministério do Esporte, a partir de 2006. Do trio, apenas Cappelli permanece no cargo, na pasta agora sob o comando do ministro Aldo Rebelo.

No dia 23 de novembro do ano passado, José Augusto Silva foi convocado pelo Ministério do Esporte para "tratar de assuntos relevantes e urgentes, inerentes ao desenvolvimento das ações previstas no plano de aplicação do convênio", de acordo com documento que o UOL teve acesso. A José Silva foi também solicitada a apresentação de "extrato atualizado da movimentação bancária da conta exclusiva do convênio". Em vão. Ele alegou que com a apreensão dos documentos pela Polícia Federal não poderia atender ao solicitado pelo Ministério.

Pagamentos irregulares

As explicações do presidente do Instituto Cidade não convenceram. No dia 9 de janeiro deste ano, um relatório interno do Ministério do Esporte que integra volumoso processo – tudo já enviado à Polícia Federal – , adianta que "há indícios de malversação do dinheiro público" na ONG Instituto Cidade, e que a mesma "não se esforça em elucidar as denúncias feitas".

Pagamentos ilegais

O mesmo relatório do ministério denuncia "pagamentos com recursos públicos de vales-transporte, previstos no plano de aplicação aos cooperados (que produziriam o material esportivo), a integrantes do PC do B que atuam em escritório regional do partido político em Juiz de Fora. Os partidários são acusados de não guardarem relação ou vínculo com as metas do convênio. Do processo consta uma lista com os “nomes dos militantes do partido que receberam os benefícios, ou seja de maneira ilegal".

  • Ministério do Esporte

    O ex-Secretário Nacional de Esporte Educacional, Wadson Ribeiro, teve como cabo eleitoral em 2010 o presidente da ONG Instituto Cidade, José Augusto da Silva, acusado de desviar recursos do Ministério do Esporte

O UOL teve acesso à lista de pessoas que receberiam o benefício. 15 delas seriam filiadas ao PC do B. Apesar desses indícios de graves irregularidades, o convênio do ministério com o Instituto Cidade ainda não foi rescindido. Segundo levantamento junto ao Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi), o Instituto Cidade foi contemplado com R$ 7 milhões do Ministério do Esporte, entre 2006 e 2011.

A coordenadora da cooperativa – constituída de pessoas carentes de Juiz de Fora para atender aos pedidos de produção de material esportivo –, Sandra Rodrigues Costa, relatou a funcionários do Ministério do Esporte que o presidente do Instituto Cidade, José Augusto da Silva, teria convocado uma reunião com os coordenadores do projeto no fim de 2011 para informar que as atividades seriam interrompidas por falta de recursos.

Nos relatos, cujas gravações foram ouvidas pelo UOL, Sandra informa que José Augusto da Silva deu um aviso claro: "Apenas teremos recursos disponíveis até dezembro (de 2011). Alertem os funcionários (da Cooperativa) que após não teremos mais dinheiro para executar as metas do convênio".

Sandra teria, então, perguntado o que foi feito dos R$ 2,9 milhões (na verdade, o repasse oficial foi de R$ 2,4 milhões, segundo o Siafi) que deveriam ser usados na produção do material. A resposta: "Eu assumo que desviei os recursos do convênio do Ministério do Esporte para outros projetos do Instituto Cidade". Para quais projetos o dinheiro teria sido desviado, Silva não informou.

O balanço do convênio é o seguinte, segundo o Ministério do Esporte:

8.000 bolas encomendadas: Nenhuma foi produzida

26.000 camisetas produzidas, ou 43% do contratado

4.900 bonés entregues, apenas 8% do previsto no contrato

Redes: foram produzidas 200 redes de futsal e outras 200 de vôlei, ou apenas 20% do total contratado

Bandeiras: nenhum material chegou à fábrica; nada foi produzido


segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Dona de navio italiano oferece ajuda a afetados; resgate é suspenso

Em entrevista coletiva em Gênova, Pier Luigi Foschi, presidente da Costa Crociere, dona do navio Costa Concordia, que adernou na Itália durante o fim de semana deixando ao menos seis mortos, disse nesta segunda-feira que as prioridades são atender aos passageiros afetados e gerenciar os riscos ambientais na região antes de mover o navio. No local do acidente, o resgate foi suspenso temporariamente devido ao mau tempo e inclinação da embarcação.

Foschi disse ainda que o Costa Concordia passou todos os testes de segurança em 2011 e que uma vez que a situação de resgate e de atendimento a todos os passageiros afetados esteja concluída, a Costa Crociere deve ter como prioridade assessar os riscos ambientais do acidente.

Cerca de 15 passageiros continuam desaparecidos, e segundo a emissora britânica BBC os trabalhos de resgate foram suspensos na manhã desta segunda-feira devido às condições de mau tempo e ao fato de que o navio se inclinou ainda mais. A expectativa é retomar as operações assim que possível.

Max Rossi/Reuters
Operações de resgate foram suspensas temporariamente no local onde o Costa Concordia adernou no fim de semana
Operações de resgate foram suspensas temporariamente no local onde o navio adernou no fim de semana

O Costa Concordia tinha toneladas de combustível em seus tanques, o que preocupa as autoridades italianas quanto ao risco de um desastre ambiental de grandes proporções --o que poderia afetar diretamente o ecossistema do Mar Tirreno, no Mediterrâneo, e o turismo da costa do Estado da Toscana.

Mais cedo, o ministro italiano do Meio Ambiente, Corrado Clini, disse que o acidente representa "um risco muito alto" para o meio ambiente da ilha de Giglio e "uma intervenção é urgente".

"O objetivo é evitar que o combustível vaze do navio. Nós trabalhamos com esta possibilidade", declarou Clini, após o naufrágio que deixou pelo menos seis mortos e quinze desaparecidos.

PREJUÍZOS

Segundo o jornal "Financial Times", a Carnival, grupo que opera 11 diferentes marcas de linhas de cruzeiros, entre elas a Costa Crociere, deve registrar prejuízos de US$ 95 milhões devido ao acidente neste ano contábil.

Já a BBC adianta que a queda do valor das ações do grupo nas Bolsas já custa US$ 1 bilhão à companhia.

As ações da empresa, que é listada nas Bolsas de Nova York e Londres, caíram 21% na abertura dos mercados nesta segunda-feira.

ERRO

A empresa Costa Crociere admitiu neste domingo que o comandante Francesco Schettino "cometeu erros de julgamento" e "não observou os procedimentos" para situações de emergência.

"A justiça, com a qual a Costa Cruzeiros colabora, determinou a prisão do comandante, contra quem pesam graves acusações", destacou a companhia.

"Parece que o comandante cometeu erros de julgamento que tiveram graves consequências" e que "suas decisões na gestão da emergência ignoraram os procedimentos da Costa Cruzeiros, que seguem as normas internacionais", informou a empresa.

Enzo Russo/Efe
O comandante do navio Costa Concordia, Francesco Schettino, foi detido em Grosseto, na Itália
O comandante do navio Costa Concordia, Francesco Schettino, foi detido na Itália; dona da embarcação o culpou

Schettino foi detido no sábado. Ele é acusado de homicídio culposo (quando não há intenção) múltiplo, de ter provocado um naufrágio e de ter abandonado o navio quando ainda havia várias pessoas a serem salvas.

O procurador da região de Grosseto, Francesco Verusio, que investiga o caso, alega que o capitão realizou uma manobra "malfeita" ao se aproximar excessivamente da ilha. Teria ainda falhado em lançar um alerta de socorro.

No comunicado, a "Costa Crociere" destaca que Schettino, que entrou na companhia em 2002, como responsável de segurança, foi promovido a comandante em 2006, após concluir com sucesso todos os cursos de formação.

A companhia afirma ainda que os membros da tripulação "realizam exercícios de evacuação a cada duas semanas" e que os "passageiros participam igualmente de um exercício" de abandono de navio logo após o embarque.

TRAJETÓRIA

O promotor de Grosseto, Francesco Verusio, confirmou neste domingo que o comandante Schettino abandonou o barco "muito antes de que todos os passageiros fossem retirados", e acrescentou que "a trajetória seguida pelo navio de cruzeiro não era boa".

Segundo a imprensa italiana, o comandante foi encontrado em terra às 23h40 (20h40 de Brasília), e os últimos passageiros só foram retirados por volta das 05h00 GMT (03h00 de Brasília).

Várias testemunhas e homens da Guarda Costeira disseram que o Costa Concordia navegava perto demais da costa da ilha de Giglio, situada diante do litoral do sul da Toscana.

Segundo alguns, o navio estava fazendo uma manobra chamada "l'inchino", "reverência" em italiano, para saudar os 800 moradores da ilha de Giglio.

O promotor Verusio afirma que o comandante "se aproximou de forma imprudente da ilha de Giglio, e o navio se chocou contra uma rocha que destruiu boa parte de seu lado esquerdo, fazendo a embarcação adernar e receber uma enorme quantidade de água em dois ou três minutos".

Filippo Monteforte/France Presse
O navio Costa Concordia, de 290 m de comprimento e 114.500 toneladas, naufragado na ilha de Giglio
O navio Costa Concordia, de 290 m de comprimento e 114.500 toneladas, naufragado na ilha de Giglio

COMO FOI

O navio levava 4.229 pessoas a bordo. O número de brasileiros no cruzeiro pode ser maior do que os 53 divulgados inicialmente pela operadora e repassados para o Itamaraty. O posto diplomático brasileiro em Roma informou ter atendido hoje outras três pessoas que não estavam na contagem inicial --elas constavam da lista americana. Com isso, o número deve subir para 56. A operadora Costa ficou de mandar até amanhã a listagem atualizada para o Itamaraty.

Segundo versões iniciais, o navio atingiu uma rocha por volta das 21h30 locais e começou a encher de água. O capitão tentou se aproximar da ilha, mas então o navio começou a virar.

Uma hipótese é que, devido a uma falha técnica, o navio tenha perdido os instrumentos de navegação, se desviado da rota e então colidido com a rocha.

A empresa Costa Cruzeiros disse que prestou socorro imediato. Porém, relatos dos passageiros contradizem essa informação.

Eles contam que jantavam quando ouviram um estrondo, mas foram orientados a continuarem sentados.

O comandante teria informado inicialmente que o navio havia tido problemas elétricos. Mas os turistas desconfiaram quando a embarcação começou a se inclinar, e os objetos, a cair das mesas.

Começou uma correria pelos salva-vidas, com pessoas tropeçando umas nas outras e caindo pelas escadas.

A rápida inclinação do navio acabou dificultando a saída dos botes, fazendo com que muitos simplesmente pulassem nas águas geladas.

Segundo os passageiros, um treinamento para situações de emergência não havia sido realizado e estava previsto para ontem.